Se um tal espaço era necessário há 20 anos, é mais ainda hoje tal o mundo que nós vivemos, o qual tende a se reduzir ao mercado normatizado e asséptico, que não se vê suficientemente bem pela tela do smartphone graças ao aplicativo “lobotomia”.]
Comunicado:
Nascido da ociosidade punk que arrastou seu mau humor nos bares da cidade e da necessidade de ter um lugar auto-organizado onde se encontrar fora dos circuitos mercantis para guiar nossas próprias experiências coletivas, o Espaço Autogestionado de Lausanne festeja seus 20 anos de existência.
Quatro lugares abrigaram sucessivamente o projeto. Foi em 17 de junho de 1993 que se ocupou o primeiro: uma vila localizada na rua Primerose, 11. Se organizaram – ali de forma parecida como ainda é hoje, porém ainda de maneira um tanto mais caótica – os concertos, as projeções de filmes, a distribuição de alimentos/refeições, um infoshop, os debates e as discussões. A experiência duraria menos de quatro meses até as retroescavadeiras destruírem a casa; mas não destruiriam a determinação dos okupas a perseguir a experiência alhures. Uma manifestação mais tarde, em 13 de novembro de 1993, seria uma antiga carroceria na rua Colline 2 que foi por sua vez okupada.
As atividades se deram ali por mais ou menos 2 anos, momentaneamente interrompidas por um político socialista que invocou a periculosidade desses lugares no intuito de arrasá-los e remergulhar a cidade na tranquilidade ronronante da época. Ante uma resistência feroz e de longas discussões com as autoridades, o Espaço Autogestionado fixará residência no antigo depósito de ônibus de Prélaz, ainda vazio.
A casa é aberta em 13 de junho de 1995 e o salão ocupado três meses mais tarde. O ambiente permite a instalação de uma forja, a associação Ciné-Clap (hoje Oblò,) estabelece ali uma sala de cinema, um vilarejo de acampamento… Cinco anos se passaram, até que a cidade envia um batalhão de polícia, que avançou com a tática de tartaruga – como à época romana – para retomar a posse daqueles espaços e permitir uma vez mais às retroescavadeiras cumprirem sua obra destrutiva.
Nós tínhamos tomado a frente em okupar os espaços vazios da Dolce Vita em 6 de julho de 2000. O lugar foi deixado deserto havia um ano e meio pelos antigos residentes, que obedeceram à ordem judicial que havia constatado a bancarrota do primeiro rock-club da Suíça. É na César-Roux, nº 30, que as atividades abundantes do Espaço Autogestionado se dão hoje.
Que caminho – e não apenas geograficamente, à guisa de peregrinação – o projeto percorreu em 20 anos, pela cidade. Vinte anos de autogestão de um projeto como esse deixou marcas na cidade, mas também nas mentes, tantas experiências produziram resultados diversos e variados.
Em 20 anos, o lugar se abriu na cidade, sem todavia se moldar, sem se institucionalizar, sem se profissionalizar (ninguém é pago) e sem participar da disneylandização das noites lausanneanas, onde tanto se fala à torto e à direita, mas sobretudo à torto sobre nossa tão bela época, na qual a segurança é organizada para promover um tédio durável e eticamente garantido.
O Espaço Autogestionado tenta “ensinar” às pessoas que o frequentam sobre o funcionamento do lugar, tenta fazê-las tomar consciência de como o lugar funciona assim tão bem depois de tanto tempo. Remete à questão as barreiras artista/público, cozinheiros/clientes, ordem de serviço/gado, a fim de distinguir uma responsabilidade coletiva do lugar. Se faz coletivamente para si e para os outros.
O Espaço Autogestionado é, entre outros lugares de reunião, para diversas associações e coletivos e mais que apenas isso. Tem a publicação do jornal Rézô além do panfleto informativo T’Okup’. Tem por vezes concertos e às vezes teatro ou exposições.
O Espaço Autogestionado é ainda lugar de manejo alimentar popular semanal, onde se aprende a fazer comer para mais de quatro pessoas e para além da carne, sem perder a cabeça pelos convidados. A aprendizagem coletiva envolve o manejo do bar, do infoshop, a limpeza, organização do armazém, desentupimento dos canos, o funcionamento de aparelhos sonoros, a luz, a eletricidade, o aquecimento, manutenção dos telhados, manejo da horta e outras ações do cotidiano do lugar.
Foi a criação de um ateliê de serigrafia que permitiu a difusão dos ideais por cartazes, folhetos, brochuras e por camisetas. É um lugar com fácil capacidade de ajudar, de acordo com os períodos e movimentações, às diversas lutas anticapitalistas, como a participação nos movimentos contra o Fórum Econômico Mundial de Davos, feministas, imigrantes ilegais, sem tetos, anti-transgênicos, anti-carceragem e anti-repressão, locais ou internacionais.
As ações ou os debates são igualmente conduzidos em solidariedade com os povos em luta em Chiapas ou também da América Latina, da Palestina, da África ou da Europa.
A maneira como essas atividades são guiadas são tão importantes como as atividades em si mesmas. É a demanda de se questionar sempre sobre o por quê e como as coisas são e de ser igualmente consciente dos limites que nos impõem o mundo tão acima daquele que vivemos. A desconstrução dos papéis assinalados aos homens e mulheres também faz parte da prática e dos questionamentos permanentes do Espaço Autogestionado, embora possa ser necessária uma dose de reforço feminista.
Se um tal espaço era necessário há 20 anos, é mais ainda hoje tal o mundo que nós vivemos, o qual tende a se reduzir ao mercado normatizado e asséptico, que não se vê suficientemente bem pela tela do smartphone graças ao aplicativo “lobotomia”.
Que nasçam muitos squats e lugares autogestionados!
Viva as lutas de bairro contra a bestificação da cidade!
Não à “mistura social nos bairros”, projeto os quais se esconde a colonização dos bairros populares pelas classes dominantes!
Cultivem a subversão!
Subvertam a cultura!
Espaço Autogestionado, junho de 2003
Tradução > TAZ
agência de notícias anarquistas-ana
nadam no vento
como carpas douradas
folhas de bambu
Akatonbo